Uma mesa de debates realizada na manhã desta quarta-feira, 19/6, no Plenário Ipê do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO), em Goiânia, provocou no público presente a reflexão sobre a violência doméstica contra a mulher e marcou o lançamento do “Protocolo de prevenção e medidas de segurança voltado ao enfrentamento da violência doméstica praticada contra magistradas e servidoras do TRT-GO”. As convidadas para debater o assunto, com a mediação da desembargadora Kathia Albuquerque, foram as delegadas da Polícia Civil de Goiás Ana Elisa Gomes e Sabrina Miranda e a professora da UFG Maria Meire de Carvalho.
A desembargadora Kathia Albuquerque abriu a discussão reafirmando a importância de discutir o assunto perante dados ainda altos da ocorrência desse tipo de violência. “Precisamos das denúncias, mas como é difícil uma mulher chegar e falar: ‘Eu apanhei, meu companheiro me bateu’”, ressaltou. Para a desembargadora, encarregada da Ouvidoria da Mulher, a importância do encontro é trazer o assunto para o debate e encorajar as pessoas que sofrem essa agressão a denunciarem.
A professora Maria Meire de Carvalho, doutora em “Gênero e estudos feministas”, lançou a reflexão sobre a quem interessa a manutenção da violência contra mulheres e meninas na sociedade. Destacou que, além da violência física, há a psicológica, que também precisa ser discutida, mencionou a violência que as mulheres trans sofrem e apontou que as mulheres negras, pardas e pobres são as vítimas mais numerosas de violência doméstica. A essas características ou marcadores sociais, ela adicionou outros, como a velhice, para abordar também o etarismo, que traz adoecimento e discriminação para a mulher.
Maria Meire falou sobre a cultura patriarcal para levantar a reflexão sobre violência e poder. “O poder do homem sobre a mulher, enquanto ele pode agredir, é um poder dado, legitimado e homologado por nós na sociedade”, ressaltou. A professora também afirmou que existe uma grande violência institucional estabelecida nos órgãos de poder, inclusive nos tribunais, onde se constata a presença de mais homens que mulheres. Maria Meire apontou que é preciso ir além da igualdade, para colocar no debate a questão da equidade entre homens e mulheres.
Segundo a professora da UFG, duas em cada três mulheres que sofrem violência a sofrem de alguém conhecido, no meio familiar, no lar, tido como um lugar seguro, mas que nem sempre é. Ressaltou a importância do acolhimento nos casos de violência e da atenção às queixas das mulheres. Maria Meire finalizou dizendo que educar hoje, no século XXI, um menino nas mesmas condições que seus pais e avós foram educados, já é uma forma de manutenção da violência contra as mulheres. “A quem interessa manter essa ordem opressiva?”, indagou.
Obediência
A delegada titular da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam), Ana Elisa Gomes, iniciou sua fala reproduzindo um inquietante áudio com o discurso público de um homem dizendo que a mulher tem a obrigação de satisfazer o marido sexualmente e culpando a mulher que não faz isso por possíveis traições do marido. Ela destacou que historicamente as mulheres são ensinadas a servir, a serem obedientes aos homens.
Na opinião dela, é preciso desconstruir discursos como o do homem citado. “São por esses e outros discursos que continuamos sendo vítimas de violência doméstica. Tem gente que aplaude isso, que concorda com isso”, frisou.
A delegada titular da Deam também ressaltou que às mulheres não são dadas as mesmas oportunidades nos cargos de poder e que é preciso que as mulheres ocupem esses espaços para que haja mudança efetiva. “Se isso não for feito, nossas filhas e nossas netas ainda viverão nessa sociedade que não nos respeita, que não nos enaltece”.
Ana Elisa Gomes citou ainda que o maior número de ocorrências na Delegacia da Mulher acontece aos domingos, dia em que as famílias geralmente se reúnem e há, às vezes, consumo de bebida alcoólica, e nas segundas-feiras, dia em que as vítimas resolvem ir denunciar a violência. “Se precisarem de atendimento, não se acanhem, nós temos uma equipe preparada. Hoje existem inúmeros mecanismos que podem, de fato, proteger vocês de novas agressões, mas é muito importante que vocês passem por esse processo de decidir pela denúncia. E atendemos todas as pessoas que procuram a delegacia e se identificam como mulheres, inclusive as trans e travestis”, reforçou.
Experiência no TJ-GO
A delegada Sabrina Miranda, chefe da Divisão de Inteligência Institucional do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO), falou sobre o protocolo criado naquele tribunal para o enfrentamento da violência doméstica contra magistradas e servidoras. Ela também ressaltou a necessidade de acolhimento dessas vítimas para que elas possam buscar ajuda.
A policial citou que um estudo feito com magistradas e servidoras do Judiciário, mulheres que conquistaram cargos profissionais mais altos, apontou que elas têm mais dificuldades internas para procurar ajuda na Deam, por exemplo, em casos de violência doméstica. “Ela briga por mulheres o tempo todo, mas para não se expor, para não revelar o que ela considera como uma derrota no relacionamento, ela não procura por ajuda”, disse Sabrina Miranda.
Ela contou que muitas servidoras do TJ-GO já procuraram ajuda em casos de violência doméstica desde a implementação do protocolo no tribunal e enfatizou que a unidade de segurança não substitui a Delegacia da Mulher. “A nossa função no Tribunal de Justiça num primeiro momento é o acolhimento”, explicou. Ao ser questionada pela desembargadora Kathia se houve mudança de postura com o protocolo, a delegada disse que à medida que o documento tem sido difundido no TJ-GO, “os sorrisos têm aumentado”, com mulheres buscando mais ajuda e com mudanças reais.
O encontro foi encerrado com as debatedoras respondendo às perguntas dos participantes na plateia. Ao final, a desembargadora Kathia Albuquerque reforçou que a Ouvidoria e a Ouvidoria da Mulher do TRT-GO também estão à disposição das trabalhadoras terceirizadas do Tribunal. “Vocês podem e devem fazer uso da Ouvidoria”, destacou a desembargadora.
Site e folder
O Protocolo de prevenção e medidas de segurança voltado ao enfrentamento da violência doméstica praticada contra magistradas e servidoras do TRT-GO foi instituído pela Portaria TRT 18ª nº 1518/2024. O documento atende a recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para que os órgãos do Poder Judiciário adotem seus próprios protocolos integrados de prevenção e medidas de segurança voltados ao enfrentamento desse tipo de violência.
O protocolo do TRT-GO compreende medidas que englobam o enfrentamento de todas as formas de violência abrangidas pela Lei 11.304/06 (Lei Maria da Penha), buscando o amplo acolhimento, a orientação e o encaminhamento de magistradas e servidoras vítimas de violência doméstica, observando-se as peculiaridades de cada caso.
Para facilitar o acesso e a compreensão do protocolo, a Coordenadoria de Comunicação Social do TRT-GO produziu um folder informativo sobre o protocolo e os tipos de violência doméstica, que vão da psicológica à física. Além disso, foi criada uma página permanente no site do TRT-GO (trt18.jus.br/mulhersegura) com as informações do protocolo e os canais internos e externos de denúncia.
Veja o álbum de fotos do evento.
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