


O Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (TRT-GO) promoveu na manhã desta sexta-feira, 6 de junho, o evento “Enfrentamento da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher praticada em face de Magistradas e Servidoras”, no Plenário Ipê. Com palestra da professora, fisioterapeuta e ex-vereadora Cristina Lopes Afonso, especialista e sobrevivente da violência doméstica, a iniciativa reuniu magistrados (as), servidores (as), terceirizados (as), estagiários (as) e público externo. O objetivo foi promover reflexões sobre o papel do Judiciário na prevenção e enfrentamento da violência doméstica contra mulheres, especialmente servidoras e magistradas.
A diretora da Escola Judicial, desembargadora Rosa Nair Reis, abriu o evento e destacou o compromisso do TRT-GO com a promoção de justiça social também para além das questões trabalhistas. “Vivemos um momento histórico em que a sociedade brasileira desperta para a urgência de combater todas as formas de violência, incluídas as de gênero. O Poder Judiciário, enquanto guardião dos direitos fundamentais, não pode se omitir diante dessa realidade. Nossas magistradas e servidoras não estão imunes às manifestações de violência de gênero que permeiam nossa sociedade”, afirmou. Rosa Nair enfatizou ainda que a violência doméstica constitui grave violação dos direitos humanos e que é papel das instituições criar estratégias para coibir esse tipo de violência, inclusive entre seus próprios quadros.
Na sequência, a juíza auxiliar da Presidência do TRT-GO, Narayana Hannas, reforçou a importância do enfrentamento institucional da violência contra as mulheres, especialmente dentro do sistema de Justiça. “É inadmissível que, mesmo em espaços historicamente ligados à promoção da justiça, ainda persistam episódios de violência contra magistradas e servidoras”, afirmou Narayana ao destacar que essa é uma luta coletiva que exige compromisso firme das instituições e sensibilidade humana de todos. Ela também sustentou a necessidade de fortalecer os canais de denúncia, garantir apoio psicológico e romper o silêncio que ainda cerca muitos casos.
Convidada especial do evento, ex-vereadora de Goiânia Cristina Lopes Afonso, conhecida nacionalmente por sua trajetória de superação, compartilhou com os presentes sua experiência. Nascida em uma família grande e afetuosa no interior do Paraná, ela cresceu num ambiente seguro, onde “nunca imaginou que uma mulher pudesse apanhar”. Em 1986, recém-formada e prestes a estudar na Alemanha, Cristina sofreu um ataque brutal do então companheiro, que ateou fogo em seu corpo. Ela sobreviveu após meses de internação e inúmeras cirurgias. “Se eu tenho 85% do corpo queimado é porque eu sou mulher. Isso não teria acontecido se eu fosse homem”, declarou.
O relato da palestrante emocionou o público ao relembrar o reencontro com o pai após o trauma da violência sofrida, quando ela estava careca, com o corpo queimado e pesando apenas 36 kg. Ao vê-la, o pai levantou as mãos e disse: “Graças a Deus que eu sou seu pai. Porque se eu fosse pai dele, eu estava morto de pensar que criei um filho para cometer uma violência dessa magnitude”. A fala, segundo a palestrante, sintetiza o caráter coletivo da violência de gênero e reforça a urgência de envolver os homens no enfrentamento dessa realidade. Ela defendeu a promoção de políticas públicas eficazes, como os grupos reflexivos para homens agressores, destacando sua atuação direta nesses espaços e os resultados concretos que tem observado.
Um dos principais eixos da palestra foi a educação dos homens e o papel do ambiente familiar na reprodução ou superação da violência. Cristina enfatizou que sua presença nos grupos reflexivos não é como vítima em potencial, mas como alguém que poderia ser irmã, filha ou colega dos participantes. Para ela, é essencial que os homens compreendam que agredir não é sinal de força, mas expressão de ausência de afeto, de equilíbrio e de humanidade. Ela defende que romper o ciclo da violência requer que se atue não apenas na proteção das vítimas, mas também na transformação dos agressores, antes que novas vítimas surjam.
Cristina, que hoje é fisioterapeuta especialista em queimaduras, também convocou uma reflexão ampla sobre como a violência se instala de forma sutil, silenciosa e estrutural. Ela explicou que a violência doméstica não está restrita a um determinado perfil socioeconômico e que atinge mulheres instruídas e independentes da mesma forma. “Quando compartilho minha história, não é apenas para falar de dor, mas para provocar reflexão. A violência que sofri começou de forma silenciosa, por meio de controle psicológico, chantagens emocionais e ameaças veladas. Muitas mulheres vivem isso sem perceber, sem nomear, sem reagir”, afirmou. “Por isso precisamos falar, trocar, despertar. Às vezes, uma fala pode ser o gatilho para que uma mulher reaja”, completou.
Ao final do evento, a psicóloga Gabriela Castro, da Secretaria de Saúde do tribunal, falou sobre o protocolo do TRT-GO para prevenção e enfrentamento da violência doméstica e familiar contra magistradas e servidoras, publicado em 2024, em atenção à recomendação do Conselho Nacional de Justiça. “O protocolo existe para dizer que nenhuma mulher está sozinha. Temos uma rede de acolhimento formada por profissionais capacitados, canais internos de escuta e proteção, além de eventos como este, que promovem reflexão e conscientização”, afirmou. A rede de apoio inclui a Ouvidoria da Mulher, a Secretaria de Saúde, a Polícia Judicial e orientações disponíveis na intranet. “Nosso objetivo é que um dia esse tipo de política não seja mais necessário. Mas enquanto houver violência, haverá acolhimento e suporte”, completou.
A palestrante Cristina Afonso é secretária de Projetos Especiais da Procuradoria da Mulher da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego), onde coordena grupos de apoio e tem percorrido o estado para implantar procuradorias da mulher nos legislativos municipais. Em dois anos, foram criadas 91 procuradorias.
O evento, promovido pela Escola Judicial do TRT-GO, faz parte da campanha nacional de enfrentamento à violência doméstica do CNJ em parceria com os órgãos do Poder Judiciário.
LN/WF
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