Conheça a história de uma trabalhadora que enfrentou o assédio sexual e encontrou na Justiça do Trabalho a chance de ser ouvida e reparada. A aplicação do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero pela juíza Wanessa Rodrigues foi essencial para promover justiça no caso.
Passados quase dois meses desde o último dia em seu antigo emprego, Laura* (nome fictício) sentiu que precisava fazer algo a respeito do que havia vivido ali. Como operadora de caixa em uma loja de bairro, ela lidava com mais do que apenas as demandas do trabalho. As abordagens pessoais constrangedoras e insistentes por parte do proprietário se iniciaram na primeira semana de trabalho e constantemente passavam dos limites. Eram toques inadequados, como abraços forçados, palavras insinuantes e promessas de favores financeiros atrelados ao aceite de aproximações indesejadas. Em pouco tempo, o ambiente de trabalho tornou-se tóxico para Laura.
Todos os dias antes de ir ao trabalho, Laura já ficava angustiada, pois queria poder focar no serviço e ser tratada com profissionalismo, respeito e cordialidade. Mas não era isso que ela encontrava. E não somente ela era vítima das investidas inapropriadas daquele superior. Várias mulheres naquele ambiente também passavam pelo mesmo constrangimento. Chegou a reclamar da situação para uma supervisora, mas nenhuma providência foi tomada.
Entre o medo de ficar sem aquele emprego e a esperança de que a situação melhorasse, ela adiou sua decisão por meses. Até que, prestes a completar oito meses de serviço, sem ver saída, pediu demissão. Com a esperança de que pudesse ter sua voz ouvida, levou o caso à Justiça do Trabalho.
Nas semanas antes da audiência, Laura se questionou se tinha tomado a decisão correta. O fato de não ter outras provas além da sua palavra e de uma colega de trabalho a preocupava. “Será que vão acreditar em mim?”, pensava. Suas dúvidas pareciam intermináveis, mas algo dentro dela a impulsionava a seguir em frente. Ela sabia que carregar aquele fardo sozinha não a ajudaria a se curar.
No dia da audiência, a presença da juíza trouxe uma sensação inesperada de segurança. Logo no início, a magistrada demonstrou empatia e cuidado, algo que Laura não esperava encontrar em um ambiente que, para ela, era distante. A juíza responsável pelo caso, Wanessa Rodrigues, preparada para lidar com o caso sob as diretrizes do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, conduziu a instrução sem interrupções desnecessárias e com a escuta atenta à cada palavra de Laura. Wanessa Rodrigues ponderava sobre o impacto de cada pergunta e cada silêncio. Em nenhum momento Laura foi tratada com desconfiança, o peso de seu relato foi considerado, livre de estereótipos que pudessem descredibilizar a sua palavra.
A magistrada registrou a presença de marcadores sociais de classe e gênero no caso e utilizou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero como fundamento. Citou, inclusive, um trecho que evidencia a gravidade do contexto: “O silenciamento de vozes dentro da organização pode levar à situação em que a violação reiterada faz com que a vítima se sinta impotente para reagir ou procurar algum tipo de ajuda.”
Em sua análise final, a juíza concluiu pela existência de um ambiente de trabalho hostil e condenou a empresa à reparação por dano moral. Além disso, determinou o encaminhamento do processo ao Ministério Público estadual e do Trabalho, devido aos indícios de infrações penais e de danos que podem ultrapassar a esfera individual.
Quando soube do resultado do julgamento, Laura ficou aliviada. Mais do que uma vitória pessoal, sentiu que aquela conquista representava um avanço coletivo para as vítimas de assédio sexual no trabalho. A justiça que ali encontrou reafirmou sua confiança na Justiça do Trabalho como um espaço de respeito e dignidade.
* Obs.: nesta reportagem, foi adotado um nome fictício, para preservar a identidade da autora.
A perspectiva de gênero
O Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero foi criado para apoiar o Poder Judiciário no combate à violência contra as mulheres e na promoção da igualdade de gênero. Ele combina explicações sobre a importância da igualdade com orientações práticas para que o tratamento e o julgamento respeitem os direitos de todas as pessoas, identificando possíveis estereótipos e evitando preconceitos e discriminações.
Trabalho livre de assédio sexual
Segundo o Tribunal Superior do Trabalho (TST), há cerca de 4,5 mil processos de assédio sexual por ano no Brasil. A aplicação do protocolo pela Justiça do Trabalho revela-se uma porta para o reequilíbrio social, com o tratamento para casos delicados, contribuindo para o direito de todas as pessoas a ambientes livres de assédio e discriminação.
A importância de reconhecer desigualdades
“(…) a desconsideração das diferenças econômicas, culturais, sociais e de gênero das partes na relação jurídica processual reforça uma postura formalista e uma compreensão limitada e distante da realidade social, privilegiando o exercício do poder dominante em detrimento da justiça substantiva.” (Pág 35)
Julgamento Imparcial
“Um julgamento imparcial pressupõe, assim, uma postura ativa de desconstrução e superação dos vieses e uma busca por decisões que levem em conta as diferenças e desigualdades históricas, fundamental para eliminar todas as formas de discriminação contra a mulher.” (Pág 36)
Desde o início do processo: respeito às necessidades específicas
Desde o primeiro contato das partes com o processo, a aplicação do protocolo exige que magistrados e servidores identifiquem desigualdades estruturais e assegurem que necessidades específicas sejam respeitadas, por exemplo, verificar se advogadas, promotoras, partes ou testemunhas são lactantes ou gestantes, adaptando a logística e a duração dos atos processuais.
Durante a audiência: valorização da palavra e combate a estereótipos
No momento da audiência, o protocolo orienta juízas e juízes a conduzir os atos processuais com atenção às desigualdades de gênero e outras assimetrias estruturais, reconhecendo a vulnerabilidade das partes, especialmente em casos de assédio e discriminação. O protocolo também orienta que as declarações da mulher sejam consideradas como elementos probatórios de grande relevância.
Nas decisões: julgamentos que promovam igualdade substantiva
Ao proferir a decisão, o protocolo orienta os magistrados a considerar o impacto das desigualdades estruturais no caso, levando em conta o histórico de discriminação da vítima; aplicando sanções que não apenas reparem o dano, mas também previnam a reincidência, e utilizando a sentença para reforçar o combate às práticas discriminatórias na sociedade.
Portas da Justiça
“Portas da Justiça” é uma série de reportagens sobre casos reais de acesso aos serviços da Justiça com um enfoque humanizado, que valoriza a experiência pessoal de quem buscou atendimento. Com ilustrações originais, o projeto aproxima a instituição da sociedade e amplia o conhecimento sobre as diversas portas de entrada à Justiça do Trabalho em Goiás.
EXPEDIENTE
Coordenação: Lídia Barros Nercessian
Gerente do Projeto: Lívia de Freitas do Lago e Abreu
Reportagens: Fabíola Mendes Vilela / Lídia Barros Nercessian / Lídia Cristina Neves Cunha / Wendel Franco de Sá Guimarães
Ilustrações: Gustavo Marques da Conceição
Artes Gráficas: Carla Cristina Carvalho / Érika Leite Cardozo / João Carlos Leal
WebDesign: Jaqueline dos Santos Martins Rodrigues
Aprovação: Geraldo Rodrigues do Nascimento
Conheça a história de uma trabalhadora que enfrentou o assédio sexual e encontrou na Justiça do Trabalho a chance de ser ouvida e reparada. A aplicação do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero pela juíza Wanessa Rodrigues foi essencial para promover justiça no caso.
Passados quase dois meses desde o último dia em seu antigo emprego, Laura* (nome fictício) sentiu que precisava fazer algo a respeito do que havia vivido ali. Como operadora de caixa em uma loja de bairro, ela lidava com mais do que apenas as demandas do trabalho. As abordagens pessoais constrangedoras e insistentes por parte do proprietário se iniciaram na primeira semana de trabalho e constantemente passavam dos limites. Eram toques inadequados, como abraços forçados, palavras insinuantes e promessas de favores financeiros atrelados ao aceite de aproximações indesejadas. Em pouco tempo, o ambiente de trabalho tornou-se tóxico para Laura.
Todos os dias antes de ir ao trabalho, Laura já ficava angustiada, pois queria poder focar no serviço e ser tratada com profissionalismo, respeito e cordialidade. Mas não era isso que ela encontrava. E não somente ela era vítima das investidas inapropriadas daquele superior. Várias mulheres naquele ambiente também passavam pelo mesmo constrangimento. Chegou a reclamar da situação para uma supervisora, mas nenhuma providência foi tomada.
Entre o medo de ficar sem aquele emprego e a esperança de que a situação melhorasse, ela adiou sua decisão por meses. Até que, prestes a completar oito meses de serviço, sem ver saída, pediu demissão. Com a esperança de que pudesse ter sua voz ouvida, levou o caso à Justiça do Trabalho.
Nas semanas antes da audiência, Laura se questionou se tinha tomado a decisão correta. O fato de não ter outras provas além da sua palavra e de uma colega de trabalho a preocupava. “Será que vão acreditar em mim?”, pensava. Suas dúvidas pareciam intermináveis, mas algo dentro dela a impulsionava a seguir em frente. Ela sabia que carregar aquele fardo sozinha não a ajudaria a se curar.
No dia da audiência, a presença da juíza trouxe uma sensação inesperada de segurança. Logo no início, a magistrada demonstrou empatia e cuidado, algo que Laura não esperava encontrar em um ambiente que, para ela, era distante. A juíza responsável pelo caso, Wanessa Rodrigues, preparada para lidar com o caso sob as diretrizes do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, conduziu a instrução sem interrupções desnecessárias e com a escuta atenta à cada palavra de Laura. Wanessa Rodrigues ponderava sobre o impacto de cada pergunta e cada silêncio. Em nenhum momento Laura foi tratada com desconfiança, o peso de seu relato foi considerado, livre de estereótipos que pudessem descredibilizar a sua palavra.
A magistrada registrou a presença de marcadores sociais de classe e gênero no caso e utilizou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero como fundamento. Citou, inclusive, um trecho que evidencia a gravidade do contexto: “O silenciamento de vozes dentro da organização pode levar à situação em que a violação reiterada faz com que a vítima se sinta impotente para reagir ou procurar algum tipo de ajuda.”
Em sua análise final, a juíza concluiu pela existência de um ambiente de trabalho hostil e condenou a empresa à reparação por dano moral. Além disso, determinou o encaminhamento do processo ao Ministério Público estadual e do Trabalho, devido aos indícios de infrações penais e de danos que podem ultrapassar a esfera individual.
Quando soube do resultado do julgamento, Laura ficou aliviada. Mais do que uma vitória pessoal, sentiu que aquela conquista representava um avanço coletivo para as vítimas de assédio sexual no trabalho. A justiça que ali encontrou reafirmou sua confiança na Justiça do Trabalho como um espaço de respeito e dignidade.
* Obs.: nesta reportagem, foi adotado um nome fictício, para preservar a identidade da autora.
A perspectiva de gênero
O Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero foi criado para apoiar o Poder Judiciário no combate à violência contra as mulheres e na promoção da igualdade de gênero. Ele combina explicações sobre a importância da igualdade com orientações práticas para que o tratamento e o julgamento respeitem os direitos de todas as pessoas, identificando possíveis estereótipos e evitando preconceitos e discriminações.
Trabalho livre de assédio sexual
Segundo o Tribunal Superior do Trabalho (TST), há cerca de 4,5 mil processos de assédio sexual por ano no Brasil. A aplicação do protocolo pela Justiça do Trabalho revela-se uma porta para o reequilíbrio social, com o tratamento para casos delicados, contribuindo para o direito de todas as pessoas a ambientes livres de assédio e discriminação.
A importância de reconhecer desigualdades
“(…) a desconsideração das diferenças econômicas, culturais, sociais e de gênero das partes na relação jurídica processual reforça uma postura formalista e uma compreensão limitada e distante da realidade social, privilegiando o exercício do poder dominante em detrimento da justiça substantiva.” (Pág 35)
Julgamento Imparcial é superar vieses
“Um julgamento imparcial pressupõe, assim, uma postura ativa de desconstrução e superação dos vieses e uma busca por decisões que levem em conta as diferenças e desigualdades históricas, fundamental para eliminar todas as formas de discriminação contra a mulher.” (Pág 36)
Desde o início do processo: respeito às necessidades específicas
Desde o primeiro contato das partes com o processo, a aplicação do protocolo exige que magistrados e servidores identifiquem desigualdades estruturais e assegurem que necessidades específicas sejam respeitadas, por exemplo, verificar se advogadas, promotoras, partes ou testemunhas são lactantes ou gestantes, adaptando a logística e a duração dos atos processuais.
Durante a audiência: valorização da palavra e combate a estereótipos
No momento da audiência, o protocolo orienta juízas e juízes a conduzir os atos processuais com atenção às desigualdades de gênero e outras assimetrias estruturais, reconhecendo a vulnerabilidade das partes, especialmente em casos de assédio e discriminação. O protocolo também orienta que as declarações da mulher sejam consideradas como elementos probatórios de grande relevância.
Nas decisões: julgamentos que promovam igualdade substantiva
Ao proferir a decisão, o protocolo orienta os magistrados a considerar o impacto das desigualdades estruturais no caso, levando em conta o histórico de discriminação da vítima; aplicando sanções que não apenas reparem o dano, mas também previnam a reincidência, e utilizando a sentença para reforçar o combate às práticas discriminatórias na sociedade.
Portas da Justiça
“Portas da Justiça” é uma série de reportagens sobre casos reais de acesso aos serviços da Justiça com um enfoque humanizado, que valoriza a experiência pessoal de quem buscou atendimento. Com ilustrações originais, o projeto aproxima a instituição da sociedade e amplia o conhecimento sobre as diversas portas de entrada à Justiça do Trabalho em Goiás.
EXPEDIENTE
Coordenação: Lídia Barros Nercessian
Gerente do Projeto: Lívia de Freitas do Lago e Abreu
Reportagens: Fabíola Mendes Vilela / Lídia Barros Nercessian / Lídia Cristina Neves Cunha / Wendel Franco de Sá Guimarães
Ilustrações: Gustavo Marques da Conceição
Artes Gráficas: Carla Cristina Carvalho / Érika Leite Cardozo / João Carlos Leal
WebDesign: Jaqueline dos Santos Martins Rodrigues
Aprovação: Geraldo Rodrigues do Nascimento