Novas tecnologias trazem riscos emergentes ao mundo do trabalho

Glossário Jurídico

2015-09-24 seminario trabalho seguro guilherme feliciano (2) A Justiça do Trabalho está pronta para acompanhar a evolução da tecnologia e novas formas de produção? Quais os riscos da nanotecnologia para a saúde do trabalhador? E o que o juiz poderá fazer diante desse novo contexto e do vazio legislativo? Essas perguntas foram objeto de reflexão durante a palestra do juiz Guilherme Feliciano, do TRT15, durante o 3º Seminário Goiano sobre Trabalho Seguro, que acontece nesta quinta e sexta-feiras, 24 e 25/9, no auditório do Fórum Trabalhista de Goiânia.

O magistrado comentou a evolução do sistema produtivo no mundo e falou sobre a mais valia relativa, que trata do aumento da produtividade em função da técnica e da ciência. Ele citou o estudo feito pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre os riscos emergentes no mundo do trabalho. Entre eles estão as inovações técnicas e os novos processos produtivos, as mudanças sociais, refletidas nas más condições de trabalho associadas ao aumento da informalidade e às correntes migratórias.

De acordo com o palestrante, os equipamentos de proteção existentes não foram projetados, por exemplo, para a produção de nanotecnologia e citou um estudo feito com cobaias que demonstrou o acúmulo de nanopartículas no fígado dos animais comprometendo o funcionamento do órgão. “Não há estudos sobre os impactos destes materiais na saúde de seres humanos e nos ecossistemas”, ressaltou. Ainda citou que no futuro 35 milhões de trabalhadores estarão suscetíveis aos riscos biológicos emergentes como consequência da evolução da biotecnologia.

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O juiz Guilherme Feliciano recebe do desembargador Mário Bottazzo o certificado de palestrante

Para o juiz, o desafio é lidar com esse novo contexto mesmo diante de uma legislação que sequer supunha esta realidade, se referindo à criação da CLT. A saída, segundo Feliciano, está na aplicação do princípio da precaução que privilegia a proteção diante da incerteza do risco. O princípio resultou da 2ª Conferência Internacional sobre o Meio Ambiente Humano (Rio 92). O juiz explica que diante de uma situação de incerteza científica, se houver uma tecnologia para prevenir certos riscos, ela deve ser incorporada. “O papel do direito do trabalho, sua única razão de ser, é humanizar as relações”, concluiu.

Confira, abaixo, entrevista do juiz Guilherme Feliciano à Rádio Web do TRT18.

De que forma a Justiça do Trabalho pode acompanhar essas novas tecnologias e principalmente os novos riscos a que o trabalhador está sujeito?

A Organização Internacional do Trabalho desde de 2010 tem apontado para os riscos laborais emergentes, especialmente aqueles ligados às novas tecnologias, nanotecnologia, biotecnologia que têm sido cada vez mais comuns. A Justiça do Trabalho, especialmente, quando começar a se defrontar com estas realidades, e isto já começa a acontecer, ela precisa ter em mente, os juízes do trabalho certamente terão isto em perspectiva, que não há hoje regras legais estabelecidas para a maior parte dessas matérias. Especialmente na nanotecnologia, não há absolutamente nada. Esperamos que o Ministério do Trabalho e Emprego venha a desenvolver normas regulamentares que tratam dessa matéria. Mas mesmo na falta dessas normas o juiz do trabalho tem à sua disposição princípios jurídicos e o mais importante deles é o princípio da precaução. Aplicando o princípio da precaução, e tendo a devida informação sobre as evoluções do estado da técnica, o juiz do trabalho, penso eu, pode dar uma resposta adequada para esses novos desafios.

Então se pode dizer que o trabalhador está amparado, mesmo não tendo nada previsto na legislação sobre esses riscos emergentes?

Sim, dei até um testemunho de alguns usos que eu próprio na jurisdição fiz do chamado princípio da precaução. Mencionei, por exemplo, o risco de explosão de uma caldeira e a possibilidade de se aguardar o final de semana e se estabelecer então um contraditório em audiência de justificação ou, diante de um laudo preliminar, que poderia ser contestado, determinar o desligamento da caldeira. E disse que, pela precaução, e mesmo em uma situação de incerteza científica, deve-se privilegiar a tutela, a proteção, e não apostar no risco. No campo das novas tecnologias, dá-se basicamente o mesmo. Experimentos demonstram que a exposição de cobaias a nanopartículas levou ao acúmulo dessas nanopartículas no fígado, com inclusive falência de órgãos. Isto não está plenamente construído na perspectiva da ciência, mas um indício demonstra o risco. Ora, numa situação como essa, num processo industrial no qual se revele haver intensamente o uso da nanotecnologia, me parece que o juiz poderia, com base na precaução, perfeitamente determinar imediatamente que se estabelecessem determinados procedimentos de proteção e de cautela paralelamente à obrigação de se investir em algum tipo de estudo. Mas é claro que dizer isso em abstrato é sempre muito distante. A possibilidade há, o juiz é que saberá da necessidade ou não de se aplicar o princípio de acordo com o caso concreto.

O papel do direito do trabalho nesse contexto da nanotecnologia, dessas incertezas científicas, é proteger o trabalhador acima de tudo?

Exato, esta é a razão de ser, é a função social do direito do trabalho. Por isso eu dizia, em matéria de ciências, e muito particularmente de ciências sociais, dizia Thomas Mun, não há algarítimos neutros, escolhe-se uma função, escolhe-se uma direção. A direção do direito do trabalho é a direção da proteção da pessoa no contexto das relações produtivas, esta é a sua função. Toda a construção em torno da proteção ou da regulação da nanotecnologia no segmento da saúde e da segurança do trabalho terá de ter esse foco. Deve ser assim a razão de ser do direito do trabalho. Isto significa plena eficiência? Não, isso significa compromisso. Compromisso de quem constrói o direito, a saber os parlamentos e o judiciário, que também constroem o direito, especialmente quando não há regras legisladas a respeito.

Fabíola Villela - Seção de Imprensa (DCSC)
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